quarta-feira, 9 de julho de 2008

Regulação e interesse privado: a Teoria da Regulação Econômica no Brasil

Bruno Francisco Cabral Aurélio e Itamar de Carvalho Junior

Com o objetivo de desenvolver uma “Teoria da Regulação Econômica”, sob o enfoque afeto às ciências econômicas, George J. Stigler acabou por desenvolver uma “Teoria Econômica da Regulação”. A afirmação pode ser constatada com a leitura de seu principal trabalho acerca do assunto, The Theory of Economic Regulation , visto que em toda sua análise, o autor demonstra que a regulação é fruto do interesse das empresas.

Nesse contesto, ganha destaque a denominada compra da regulação, fator promotor de novos custos a serem contabilizados pelas empresas, no qual se incluem o financiamento de campanhas eleitorais dos políticos envolvidos; o oferecimento de cargos para os ainda funcionários especializados dos órgãos reguladores, dentre outros.

Prossegue o autor afirmando que a regulação econômica nasceu e se mantém para satisfazer os interesses privados, fundamento da chamada “teoria dos grupos de interesse”, por meio do qual tais grupos influenciariam os órgãos reguladores em busca de normas que os beneficiassem, seja na imposição de regulamentos que retirassem concorrentes do mercado ou que criassem barreiras à entrada de novos players.

Entretanto, o autor demonstra que a busca por benesses estatais não se restringe às normas técnicas - como ocorre com as de natureza farmacosanitário -, mas também pela instituição de novos tributos ou majoração dos já existentes, seja para os concorrentes internos ou estrangeiros.

No Brasil, a “teoria da regulação” ou somente “regulação”, apesar de existir há muito tempo, ganhou destaque e virou pauta de discussão após a reforma da administração pública e a criação dos agentes reguladores descentralizados. A discussão em torno destes entes vai da independência financeira à competência normativa.

Ademais disso, de mãos dadas ao debate mundial, não ficou fora da discussão a possibilidade destes novos/velhos órgãos reguladores sofrerem pressão das empresas agora “reguladas”, mantendo-se o enfoque sob a mesma preocupação bem exposta por Stigler, na qual contesta-se a independência funcional dos agentes reguladores face à Administração central e, em especial, a dos “grupos de interesses”.

No Brasil, curiosamente, as empresas ou “grupos de interesses” concentram nos procedimentos de consultas públicas as principais oportunidades para exercerem, sob o suposto véu da legitimidade, pressão indevida para “dirigir” as normas regulatórias. Porém, obviamente que a mencionada influência exercida durantes as consultas públicas, de maneira alguma, exclui a realizada em momento anterior, de modo que estas consultas, em regra, apenas são instauradas para cumprir formalidade legal.

Contudo, apesar desta inevitável pressão exercida pelas empresas, em sua grande maioria, os órgãos reguladores (agências reguladoras) exercem suas funções com relativa isenção, muitas vezes criando normas técnicas deveras onerosas às empresas reguladas.

Em razão desta relativa imparcialidade dos órgãos reguladores (agências) no exercício de suas funções, algumas empresas ou “grupos de interesses” brasileiros se viram obrigados a direcionar seu foco de influência para a Administração Pública central, buscando desta, decisões impróprias (já que as agências reguladoras são, por lei, autônomas em relação ao poder político), seja por meio de alteração de atos normativos superiores e vinculantes às agências, seja pela retirada indevida de seus dirigentes ou até mesmo por contingenciamentos orçamentários.

Todos os recentes acontecimentos amplamente noticiados pela imprensa brasileira bem corroboram o acima descrito, demonstrando que a Administração Central tem desestruturado todo arcabouço regulatório legalmente desenhado e implementado no final dos anos 90 , fator que pavimentou o caminho para o incremento dos investimentos privados no país.

O caso até então noticiado do setor de telecomunicações brasileiro bem serve para comprovar a verossimilhança da teoria desenvolvida por George Stigler, pois, em linha com o assumido publicamente por ministros de Estado, é iminente o grande interesse do atual governo federal na criação de uma grande empresa de capital nacional no setor de Telecom. Com isso, o pensamento é naturalmente conduzido para quais seriam as efetivas razões motivadoras do processo de alteração desse marco regulatório, in casu, a finalidade de criação desta “super empresa nacional”.

Deste modo, aos particulares consumidores, objeto de imediata proteção da hipotética teoria da regulação majoritariamente adotada pelos seus pensadores e defensores, resta apenas aguardar o desfecho dos acontecimentos, além dos reflexos de qual será o custo direto e indireto de toda essa operação, algo que fatalmente será repassado ente ao mais frágil da relação.

Nesse ponto, para conclusão desse pequeno excerto, cabe transcrever o sintético desfecho formulado por George Stigler em sua teoria, assertiva que se põe a prova quanto a sua confirmação pela atual política do Brasil, e que, ao menos em princípio, se apresenta com um infeliz e justaposto encaixe:

A regulação tanto pode ser ativamente perseguida por uma indústria, como também pode ser imposta a ela. Uma das teses centrais deste artigo é a de que, em regra, a regulação é adquirida pela indústria, além de concebida e operada fundamentalmente em seu benefício. Há, é claro, regra de regulação cujos efeitos, na prática, são inegavelmente onerosos às indústrias reguladas; um exemplo simples é o da tributação diferencialmente pesada sobre determinados produtos dessas indústrias (uísque ou jogos de cartas). Essas regras onerosas de regulação, contudo, são excepcionais e podem ser explicadas pela mesma teoria que explica uma regulação benéfica (podemos chamá-la de regulação “adquirida”.

Quarta-feira, 9 de julho de 2008

Fonte: Última Instância